quinta-feira, outubro 08, 2009

Nada para além do adeus

O olhar exigia mais que as palavras podiam expressar. Olhei a parede, que encarar qualquer coisa parecia mais certo que responder. Eu engasguei com meu suco, mas não foi o suco que pôs aquele nó entalado na minha garganta.

Canta alguma coisa.
O que?

Sei lá, acompanha essa música que está tocando.

Eu não sei cantar, e ela sabe disso, como sabe do índice de radiação solar de hoje, meu índice de massa corpórea, o índice de desmatamento na região amazônica. Sou incapaz de pensar em algum índice que ela não tenha conhecimento. É como uma degustadora de fatos.

A música que tocava era Lanterna dos Afogados. Um clássico de alguma adolescência, talvez da do dono do bar. Da minha, não estava certo. Eu ainda tinha seus olhos sobre mim, aquele peso que, um lado masoquista da minha mente, um lado que aprendi a seguir como arremedo da razão, ficava feliz de pensar como sendo a última vez que sentia.

Canta essa.
Eu não sei!
Sabe. Claro que sabe
.

Só porque todos sabem.

Por isso não cantei. Quando disse adeus, eu respondi com um tchau, que era uma epítome de tudo que eu não podia dizer. Agarrei-me na conta fazendo dela meu salva-vidas. Ela sairia pela porta, eu estaria lá, praguejando contra o tempo chuvoso para o dono da bar. Ele me diria adeus, volte sempre, eu nunca mais voltaria. Poderia seguir meu caminho, apertando o casaco no corpo, sentindo a gélida chuva fina, a gélida partida dela. E só.

Ironia da vida, eu estaria feliz todas as vezes que ela entrasse em contato. Sempre parecendo animada com minha felicidade, eu com a dela, mas seria mentira. Porque assim que ela desligasse, os problemas tomariam minha mesa, eu não veria soluções à frente, como nunca vi. Choraria todas as terças, quando por acaso lembrasse que ela foi embora. Só que praticamente nunca lembraria.

Mas passei o cartão, e ela estava lá, me esperando; ofereceu carona, ajeitou meu cabelo que estava na frente dos meus olhos, pondo-o de qualquer jeito atrás da orelha. Agradeci, só porque gritar seria escandaloso. Tudo que esperava era estar enclausurado novamente em meu apartamento, para gritar durante o tempo que me conviesse, que eu nunca amei você. Gritar até a garganta doer, minha goela arder, eu acreditar.

Não houve uma resposta a pergunta, sentirá minha falta?. No futuro, eu sabia, seria difícil sentir. Ficaria cada vez mais frio e alheio, e não me enganei. Ao fechar a porta de seu carro, sorri sem pesar e sem sinceridade. Olhei o carro partir, se demorando para virar a esquina. Depois, ao entrar em casa, puxei o telefone da tomada e desliguei o celular. Só os religuei passados dois dias de sua viagem.

Nenhum comentário: