sexta-feira, agosto 14, 2009

Aos Pedaços (escrito hoje, em homenagem a um desconhecido)

O tempo está frio. Eu estou lúcido.

Da janela do vigéssimo andar do prédio, olho a avenida – como em várias canções que já ouvi. O personagem sou eu, eu olho os carros e a cidade da janela daquele andar. Meditei qual cantaria, se soubesse cantar.

Toca o telefone, sei quem pode ser aquela hora da manhã. Eu diria alô, e logo seria soterrado pela enxurrada matinal de ideias daquela menina tola. Ela diria poder abrir meus olhos ao fugaz mundo inventivo das imagens, que ela orquestrava. Mas eu estou lúcido, como nunca. Nada mais será inventado.
Arremesso o telefone sacada abaixo, observo-o cair e se fazer em pedaços na calçada ainda vazia. E os pedaços não tem nome. Só tem nome quando fora inteiro.

Acendo aquele cigarro amassado que encontrei dentro do bolso do jeans. Na memória a canção escolhida, nos pés, seu ritmo incerto. Não lembro o ritmo. Penso na garota ingênua que quer abraçar com força tudo que lhe era alheio. Porque tudo é alheio, até o que nos concerne. Eu teria um pasto, com vacas e bodes, mas não saberia da vaca sua grama favorita, não saberia do bode sua cabra amada. Nem saberia se bodes amam. Não sei ao certo se eu amo.

Sinto o frio entrar pelas narinas, solto a fumaça do cigarro. A negação faz bem a uma alma perturbada. Meu celular toca e sei exatamente quem é. Atendo, pois o celular é caro demais para acabar-se na via pública. A garota reclama do meu telefone, eu respondo que estragou, ela brinca dizendo que tudo-estraga-um-dia. Ela diz tempo-frio-não? Frio e despedaçado, como eu. Ela me lê uma frase que, diz, achei-reveladora: “Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade. Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer.”*

Pouso o celular ainda ligado, na cadeira. Termino o cigarro. Olho os carros transitando sem me prender ao olhar. E me atiro da sacada.

Não ouço além do vento que congela minhas orelhas. Antes de chegar ao chão, penso no porque e me lembro. É que pedaços não tem nome.

*Do poema A Tabacaria, de Fernando Pessoa
Daqui: http://caramboladacinderela.blogspot.com/2009/07/30-contos-12-odeio-interpol.html

2 comentários:

Alessandra disse...

Gostei Ponto

Fred Paiva. disse...

puta merda, já disse q vc é foda hoje? não, né, é cedo ainda... tá, não vou dizer pois é cedo para palavrões, descer o nível ao baixo calão, então digo, você é relação sexual no ânus de uma lagartixa vesga, arrombadora!