Cansado de dizer as mesmas coisas, sobre todas as coisas que ele conhecia, de todas as pessoas que ele já sabia o nome, sobrenome, endereço e opção sexual, sobre as tarefas nefastas da vizinha do duzentos e quatro e todas as últimas novidades do velho mundo, Ernesto resolveu se calar.
Decidiu – mérito da vizinha já citada, suas altercações acerca de sua tremenda boca grande – nada dizer, se não questionado. Para quê, pôs-se a conjecturar numa tarde ociosa, gastar saliva, pensamentos, se o que se diz se perde no vazio das coisas, que são tantas, que desaparecem no piscar dos olhos? (Menos, é claro, a fama da vizinha).
Absteve-se de fazer sugestões, puxar conversa, cumprimentar alheios, engrenar uma discussão sobre assuntos diversos.
Primeira semana estranharam sua reclusão e suas monossilábicas respostas. Segunda semana estava em definitivo excluso das fofocas, por sua falta de empolgação. Na terceira semana passou a ser o alvo das conversas no cafezinho.
Disseram que estava sofrendo de depressão. Foi ao psicólogo, como solicitado pelo chefe, mas acha, até o hoje, que deve ter matado o doutor de tédio – três meses de tratamento para ser diagnosticado como sociopata, e nem uma frase significativa dita por ele.
Tomou todos os remédios prescritos, ainda que soubesse não estar enfermo, e passou a rir descontroladamente das pessoas na rua – sem motivo aparente algum.
Ria à noite. Chegava as gargalhadas. Conseguiu diversas vezes acordar meio prédio com os agudos esguichados de seu riso. A vizinha do duzentos e quatro chegou a acionar o manicômio.
Mesmo preso e abilolado, Ernesto manteve sua posição, e nada dizia que valesse.
Morreu só, em meio aos doidos, que, aprendeu a acreditar, eram os que melhor sabiam o que diziam.
Um comentário:
Fica a vontade de ser Ernesto e calar-se ante nosso caos...
mas não sei... sou muito conversativo
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